A performance “Afluente”, de Ziel Karapotó (1994), foi um dos momentos mais potentes da ArtRio 2024. Um dos três artistas indígenas a representar o Brasil na 60ª Bienal de Veneza e indicado ao prêmio PIPA 2024, em sua primeira participação na Feira de Arte do Rio, também apresentou obras no estande da Christal Galeria, como parte do programa Brasil Contemporâneo.
“Estamos vivendo em plena crise climática, tendo os impactos desse extrativismo desenfreado. E a performance é um trabalho sobre o poder e as conexões por meio das águas e suas relações dentro da cosmologia indígena. Nós somos águas que confluem, que se conectam e estabelecem uma rede de cura”, explica.
Na ação, o artista utilizou moringas feitas de cabaça, uma das primeiras plantas cultivadas no mundo. “Dentro de muitas culturas indígenas, não só a minha, são recipientes sagrados, para preparos de tratamento e cura. E a defumação com o tabaco nos protege, nos cura e nos faz conectar com a força sagrada, com os encantados”.
Natural da comunidade Karapotó Terra Nova, São Sebastião, Alagoas, Ziel Karapotó reside atualmente na reserva Indígena Marataro Kaetés, em Igarassu (PE). É coordenador geral da Associação de Indígena em Contexto Urbano Karaxuwanassu (ASSICUKA) desde 2021 e é formado em Artes Visuais pela Universidade Federal de Pernambuco.
“Eu acho que, ao fazer licenciatura, eu me deparei com uma lacuna imensa sobre a história e a expressividade dos povos indígenas. E ali, naquele campo, em meio a essas ausências, eu tive que fazer alguma coisa para me reafirmar, para demarcar esse território. E aí, acredito que a partir de 2016, eu começo primeiro a utilizar performance no meu próprio corpo, como ferramenta, que irá e propor narrativas para apresentar minha cultura dentro de um território de ausências”.
Sua trajetória é marcada por produções e atuações nos campos das artes visuais e do audiovisual, com trabalhos e pesquisas que abordam as poéticas indígenas, as configurações identitárias e o racismo sobre as etnias originárias, em especial sobre os povos indígenas no Nordeste.
“É muito importante a minha presença e a presença dos outros parentes, porque eu acho que a gente vem ultimamente ampliando o cenário da arte contemporânea brasileira. É algo muito recente e ainda temos muito a construir, a preparar neste território, para que possamos compartilhar de uma coisa realmente legítima desse território, que se chama Brasil”, completa.
Texto: Domi Valansi
Foto: Bruno Ryfer