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Sol a pino

02/04/2019 - Por ArtRio

A Fortes D’Aloia & Gabriel tem o prazer de apresentar a nova exposição de Nuno Ramos no Galpão. Sol a pino toma a pintura como elemento central, resgatando seu protagonismo na poética do artista, e reúne ainda uma série de desenhos inspirados na tragédia Antígona, além de vídeos de performances recentes. Ao longo da mostra, testemunhamos sua inquietação ante as transformações do mundo atual, ora tentando apreendê-las, ora extrapolando-as em potência criativa.

Nuno é um artista multifacetado. Sua prática transita entre pintura, escultura, instalação, desenho, performance e vídeo. A destacada trajetória nas artes visuais é entremeada por uma atuação consistente também no teatro e na literatura, com livros premiados em prosa e poesia, além de colaborações frequentes como letrista – e não são raras as ocasiões em que todas as facetas se mesclam e se confundem. Em meio a esse turbilhão, Nuno tem indagado nos últimos anos a posição que a pintura ocupa em seu núcleo poético, presença constante desde o início da carreira na década de 80, no ateliê Casa 7.

As pinturas da série Sol a pino partem desse questionamento e apontam para o que ele descreve como “desejo de solarização”, uma tentativa desesperada de alegria em tempos soturnos. São obras com cerca de 250 quilos cada, nas quais ele emprega uma versão particular da encáustica – uma mistura de tinta óleo, parafina, vaselina e pó – para materializar cores elétricas em superfícies pantanosas. O método é feito a quente, isto é, o tempo curto de resfriamento do material exige ações rápidas e cada etapa ganha um ritmo aflito. Essa talvez seja uma das razões para Nuno voltar-se à pintura: o apreço por colocar-se sempre em risco, no limiar do controle sobre os materiais. Feitas no chão, as obras recebem ainda uma variedade de objetos como pelúcia, tecidos, câmara de pneus, placas de cobre e alumínio. Nuno os adiciona para construir uma topografia, subindo relevos e abrindo leitos, em um processo que ele relata como “equalização das diferenças”.

A potência solar das pinturas tem seu contraponto nos vídeos e nas obras sobre papel da exposição, que trazem temas mais mundanos. A série de desenhos evoca a figura de Antígona para tratar do embate dos desejos individuais ante o arbítrio do Estado. Na tragédia grega narrada por Sófocles, a personagem luta pelo direito de enterrar seu irmão morto Polinices, a despeito das ordens do Rei Creonte. Nuno apropria-se dos “pensamentos de poeira” (verso da peça) de Antígona como dispositivo para criar os desenhos: ele espalha pó de grafite sobre o papel em uma alusão ao sepultamento. Fragmentos de homens e coroas são figuras frequentes na série e ganham forma à medida que ele subtrai os vestígios do pó com máscaras de fita ou adiciona a tinta para solapar a composição. Como é comum na poética de Nuno, o uso da palavra dá origem a um vocabulário visual autônomo, que expande seu significado para além da página.

Completando a mostra, os vídeos são registros das performances teatrais Aos Vivos, trilogia concebida para acontecer em paralelo aos debates de TV das eleições presidenciais do último ano. A premissa consistia em munir os atores no palco com fones de ouvido para que reproduzissem as falas dos candidatos em tempo real. Na ausência do debate no segundo turno, foram usados os áudios da programação televisiva do horário. Em cada uma das peças, Nuno adicionou um elemento externo para interferir nos discursos: no primeiro debate, uma bailarina rodopiava no centro do palco como um dervixe; no segundo, trechos de Antígona eram sussurrados através de tubos de vidro; no terceiro, os diálogos e a trilha sonora do filme Terra em Transe (Glauber Rocha, 1967) faziam a contraposição. É latente no projeto o empenho de Nuno em captar o real enquanto ele ainda acontece, como se a representação por si só não fosse o bastante para compreender a urgência das transformações em curso. Na exposição, seu esforço ganha forma e peso, e os vídeos são exibidos em telas incrustadas em pedras. Se nas pinturas é notável o desejo de transformar a matéria inerte em algo vivo, nesses trabalhos o movimento é oposto: a experiência volátil do agora é solidificada no mármore.

Nuno Ramos nasceu em 1960, em São Paulo, onde vive e trabalha. Suas exposições individuais recentes incluem: O Direito à Preguiça, CCBB (Belo Horizonte, 2016); O Globo da Morte de Tudo, em parceria com Eduardo Climachauska, SESC Pompeia (São Paulo, 2016) e Galeria Anita Schwartz (Rio de Janeiro, 2012); HOUYHNHNMS, Estação Pinacoteca (São Paulo, 2015); Ensaio Sobre a Dádiva, Fundação Iberê Camargo (Porto Alegre, 2014); Anjo e Boneco, Museu Oscar Niemeyer (Curitiba, 2013); 3 lamas (ai, pareciam eternas!), Galeria Celma Albuquerque (Belo Horizonte, 2012), Fruto Estranho, MAM Rio (Rio de Janeiro, 2010). Destacam-se ainda suas participações na Bienal de São Paulo (2010, 1994, 1989 e 1985) e na Bienal de Veneza (1995). Sua obra está presente em grandes coleções institucionais como: Tate Modern (Londres), Walker Art Center (Minneapolis), Inhotim (Brumadinho), MAC-USP (São Paulo), MAM-SP (São Paulo), entre outras.

Em 16 de Abril, Nuno Ramos lança seu mais novo livro, Verifique se o mesmo, no espaço Tapera Taperá (Av. São Luís 187, Loja 29, São Paulo). Publicado pela Editora Todavia, o livro reúne ensaios diversos sobre a cultura brasileira.

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